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Alfredo Marceneiro "O Patriarca do Fado"

Alfredo Marceneiro - A Família

Vítor Marceneiro, 17.01.13

Entretanto, teve três irmãos, o Júlio o Álvaro e a Júlia, que ele ajudou a mãe a criá-los, foram-llhe  sempre muito dedicados.

Passam os anos e os seus irmãos  casam,  e organizam as suas vidas.

Alfredo fica a tomar conta da  consigo mãe Gertrudes e aluga uma casa num típico pátio sito no Nº 49 da Rua da Páscoa, em Campo de Ourique — Freguesia de Santa Isabel —, casa onde viveu até ao último sopro da sua vida.

Por altura dos seus 22 anos, duma paixão pela jovem Aurora, filha de um mestre de ofício de marceneiro, nasce o seu primeiro filho. Em memória de seu saudoso pai, dá ao primogénito o nome de Rodrigo. Nunca cantou o Fado. Abriu na Calçada de Carriche um retiro com o nome de "Solar do Marceneiro", a sua profissão era mecânico de motos e bicicletas, tendo uma oficina sua em Campolide onde é hoje o restaurante Número Um. 

De outra paixão, pouco duradoura, é novamente pai de um rapaz a quem dão o nome de Esmeraldo. Tinha a profissão de tipógrafo e chegou a cantar como amador em festas particulares. 

Numa festa a que vai cantar, na Fonte Santa, Alfredo conhece uma linda jovem chamada Judite. É então que decide constituir lar e desta união com Judite de Sousa Figueiredo, sua companheira até ao fim dos seus dias (tratava-a carinhosamente por "A minha querida "Ti Judite"), nascem os seus filhos Carlos, Alfredo e Aida.

 

 

JUDITE DUARTE "TI JUDITE"




O Carlos cantou como amador e o Alfredo veio a ser profissional de Fado, tal como o pai, a Aida foi modista.

O seu irmão Júlio Duarte, que também cantava o fado e era seu companheiro nas andanças fadistas, casou com uma jovem de seu nome Leonor Duarte, também fadista, a qual chegou a cantar num disco com o seu cunhado Alfredo. Os seus irmãos, quer a Júlia quer o Álvaro, nunca cantaram.

 

 

 

JULIO DUARTE

Como seu irmão Alfredo, Julio Duarte pertenceu a um núcleo de fadistas que sabiam ser fadistas, que cantava o Fado amando-o, merecendo o apreço do público e dos seus colegas.

Nasceu em Lisboa, na Freguesia de Santa Isabel, e é manufactor de calçado. Até casar viveu sempre com a mãe e os seus irmãos, tendo pelo irmão mais velho, o Alfredo, uma admiração muito especial, pois considerava-o como um pai.

Tinha apenas 14 anos quando começou a cantar o Fado, estreando-se no Centro Republicano Miguel Bombarda, sendo muito solicitado para actuar em academias de recreio, festas de caridade e actuou em quase todos os retiros da época,  como no antigo Teatro Étoile, da calçada da Estrela, fazendo números de variedades com a pequenina actriz Hortense de Castro.

Torna-se profissional em 1928. Cantou-o então, nas cervejarias Boémia, Cervejaria Jansen, Rosa Branca, Chagas, Vitória, Cafés Portugal, Sul-América, Anjos, Julio das Farturas, Solar da Alegria (quando da gerência. de Alberto Costa), Salão Artístico de Fados, teatros Capitólio e Joaquim d'Almeida, nos clubes Tauromáquico, Olímpia, Montanha, Patos, Alhambra, e nos. Cinemas Europa, Jardim-Cinema, Cine Paris e Royal. Percorreu as províncias, cantando nos te­atros de Évora, Barreiro, Seixal, Montijo. Setúbal, Torres Vedras, Malveira, Quinta do Anjo, Torres Novas, Caldas da Rainha, Mafra, Cadaval, Figueira da Foz, Abrigada, Cascais, Estoril, Moita, Parede, Paço d' Arcos, Alenquer, Feliteira, Merceana e Benavente.

Cantou nas casas fidalgas do Conde da Torre e Conde de Sabrosa, nas herdades do opulento lavrador Palha Blanco.

Tal como o seu irmão Alfredo, foi autor de várias músicas para Fados, “Combatentes”, “Crença”, “Fado da Paz”, “Fado da Aldeia” (gravado por Ercília Costa), “Fado Marcha”, “Lágrimas”, (gravado por Maria do Carmo), e ”Fado Luso”.

Da sua carreira de cantador, há uma tarde que Júlio Duarte gravou na memória, por assinalar um dos seus maiores êxitos. Foi em Vila Franca de Xira, no Retiro Botão de Rosa, onde cantou ao lado de Júlio Proença, Estanislau Cardoso e João Maria dos Anjos, com o acompanhamento do guitarrista e cantador Carlos Ramos e do violista  Armando Machado. Houve uma cena que ficou famosa nessa noite: encontravam-se presentes dois detractores do Fado, comba­tendo-o grosseiramente. Com toda a gente enervada, começaram, ele  os colegas, a cantar, sendo  aplaudidos pela assistência que enchia o salão, de tal forma que a barulhenta parelha foi obrigada a retirar-se, com os dois basbaques vexados e ven­cidos. Foi uma tarde de triunfal.

Finalmente,, Julio Duarte actuou  no Retiro da Severa, Solar da Alegria, Cafés Gimnasio, Luso e Mondego, Foi também muito solicitado para actuar na rádio, Emissora Nacional, Rádio Luso, Rádio Graça e Rádio Peninsular.

Cantou muitas vezes com o irmão, que só se profissionalizou mais tarde, embora tendo a fama que se sabe, mas já não assistiu a esse acontecimento, pois faleceu prematuramente.

Julio Duarte foi casado com uma fadista de renome nesses tempos, Leonor Duarte, de quem teve duas filhas,  Júlia e a Aida.

 

 

 

LEONOR DUARTE

Natural de Lisboa, foi esposa do cantador Júlio Duarte e cunhada de Alfredo Duarte “Marceneiro”

Dotada duma excelente voz e com uma excepcional dicção, dava tal senti­mento aos versos que cantava, aliada a uma excepcional dicção, que em bem pouco tempo impôs o seu nome do can­tadeira de Fado. Estreou-se a cantar no posto emissor de Abílio Nunes dos Santos e  agradou de pronto e de  tal modo, que foi imediatamente contratada para gra­var em disco os seguintes fados: «Os pequeninos», «A Pastora», «Fado Aida», «0 teu olhar», «Desgarrada de Amor» (com o cunhado Alfredo Duarte “Marceneiro” e «A morte da Pastora».

Foi autora da música do Fado Os Pequeninos, que teve um grande sucesso. Cantou várias vezes, por es­pecial deferência, no Solar da Alegria com o marido Júlio Duarte, (aquando da gerên­cia de Alberto Costa), em festas de beneficência, tendo tomado parte também em diversos espectáculos, quase sempre na companhia do marido ou do cunhado.

Da sua curta mas brilhante carreira como cantadeira de Fados, a noite que mais a emocionou foi a da sua despedida, em 20 de Agosto de 1932, que coincidiu com a festa artística de seu marido, no Café dos Anjos, em que o pú­blico lhe tributou uma calorosa e prolongada ovação que muito a sensibilizou.

Leonor Duarte abandonou a sua carreira para se dedicar exclusivamente á educação de suas filhas, Júlia e Aida.

 

© Vítor Duarte Marceneiro

 

 

Licença Creative Commons
Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual 4.0 Internacional, assim como registo na Sociedade Portuguesa de Autores, sócio nº 125820, e Alfredo Marceneiro é registado como marca nacional no INIP, n.º 495150.

Alfredo Marceneiro as Origens

Vítor Marceneiro, 01.01.13

Seus pais, Gertrudes da Conceição e Rodrigo Duarte, eram ambos naturais do Cadaval, descendentes de duas conhecidas famílias da região, os Coelho e os Duarte, mas gente humilde.

Amigos e companheiros de brincadeiras desde crianças atingiram a idade adolescente com a amizade transformada em amor. As perspectivas de futuro também nessa altura eram difíceis na aldeia, pelo que decidiram partir para Lisboa à procura de melhores condições de vida. Corria o ano de 1887. Gertrudes já trazia no seu ventre a semente do seu amor e mal chegam à capital casa com Rodrigo na Igreja de Santa Isabel, recebendo dos lábios do padre Santos Farinha a bênção matrimonial.

Rodrigo Duarte era mestre de corte de calçado, tendo arranjado colocação numa sapataria da Rua da Madalena e graças a esse salário consegue alugar uma pequena casa na freguesia de Santa Isabel, num prédio da Travessa de Santa Quitéria. Hoje já não existe: foi demolido para abertura da Avenida Álvares Cabral.

E foi nessa casa que nasceu para o mundo o primeiro filho do casal Duarte, no dia 29 de Fevereiro de 1888,, mas só foi possível registá-lo, por falta de posse, e foi asiim que lhe foi dado, na pia baptismal, o nome de ALFREDO RODRIGO DUARTE, pelo mesmo pároco que havia unido em casamento seus pais, mas três anos depois em 1891, como não era ano bissexto tiveram que adoptar a data de 25, e foi assim que nos registos oficiais consta que nasceu a 25 de Fevereiro de 1891.

Com o acréscimo de responsabilidades e um novo incentivo na sua vida, Rodrigo Duarte pensou em melhorar a sua situação económica e resolveu assim jogar a sua sorte estabelecendo-se por conta própria, com uma oficina de calçado na Rua de São Bento.

A vida decorreu normalmente para a família Duarte, que viu aumentar o seu lar com o nascimento de mais três filhos: o Júlio — que foi também fadista de nomeada —, o Álvaro e a Júlia, todos igualmente baptizados pelo bondoso padre Santos Farinha, na Igreja de Santa Isabel.

O pequeno Alfredo frequenta a escola primária, tendo desde cedo demonstrado uma especial aptidão para a leitura e gramática, repartindo a sua infância pelas brincadeiras no Jardim da Praça das Flores e ajudando seu pai na oficina, durante as férias escolares.

No carnaval quando as cegadas (representações teatrais populares) saíam para a rua, deliciava-se a ouvir os descantes e seguia alegremente as exibições dos actores de rua nas suas digressões pelo bairro, decorando os versos que ouvia. Chegado a casa, logo seus pais se transformavam em plateia, ouvindo com profundo deleite o génio do pequeno Alfredo.

O seu gosto pelo canto é influenciado por sua mãe que, nas descamisadas, nas romarias e nos bailaricos lá da terra, cantava que era uma delícia. No entanto, quer seu pai — que tinha pertencido à banda musical do Cadaval —, quer seu avô materno, José Coelho, transmitiram-lhe fortes influências, especialmente o segundo, que tocava guitarra e cantava fados de improviso.

Já homem feito, sempre que falava de sua mãe, recordava o seu cantar enquanto fazia a lide caseira. De entre os muitos versos populares que a ouvia entoar, um dos mais preferidos, rezava assim:

 

Nasci nas praias do Mar

Ás fúrias do vento irado

Tinha por berço, uma lancha

Por lençol, o Céu estrelado

 

Rodrigo Duarte apercebeu-se de que o seu pequeno Alfredo tinha intuição para a música e queria que o filho aprendesse os rudimentos musicais.

Infelizmente, não viveu o suficiente para ver satisfeitos os seus desejos, porquanto aos 38 anos de idade a morte o ceifou, arrancando-o brutalmente do convívio dos seus entes queridos.

Foi o padre Santos Farinha quem, apesar da avançada idade, integrou o cortejo, a pé (como era hábito na época), que acompanhou o corpo do desditoso Rodrigo Duarte à sua última morada, o cemitério dos Prazeres, revelando a grande amizade que nutria pela família Duarte.

Aquele sarcedote, que seguia de perto o desabrochar do pequeno Alfredo, chegou a sugerir a seus pais, o envio deste para o seminário, pois via no jovem grandes capacidades.

Decorria o ano de 1905 e o pequeno Alfredo, então com 13 anos, profundamente abalado pela perda do pai, viu-se forçado a abandonar os estudos para começar a ganhar a vida, ajudando assim sua mãe a criar os seus irmãos mais jovens. A ida para o seminário ficava também fora de hipótese.

Infelizmente não chegou a haver condições de ter ficado com uma foto do pai.

 

© Vítor Duarte Marceneiro in “Recordar Alfredo Marceneiro”

 

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Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual 4.0 Internacional, assim como registo na Sociedade Portuguesa de Autores, sócio nº 125820, e Alfredo Marceneiro é registado como marca nacional no INIP, n.º 495150.